Acordei assustado devido ao sonho, apesar de
que estava mais para pesadelo. Nesse sonho eu tinha envelhecido, beirava os 30 anos,
e estava num quarto de hotel em Paris, até aí tudo normal, mas ao meu lado na
cama, ainda dormindo, tinha uma loira cujo rosto não era muito definido, talvez
porque eu não a conhecesse. Era tudo claro e ao mesmo tempo confuso, eu só
sabia que estávamos na França porque do quarto onde estava podia ver a Torre Eiffel.
Mas de repente o cenário mudou, eu estava no avião encarando uma revista de
fofocas e apesar das letras estarem embasadas eu podia ler algo como “A farra continua”, esse era o titulo, e
a foto era aquela loira do quarto e eu nos agarrando no que parecia uma rave.
Mais embaixo consegui ler algo como “Mais
uma entra para a lista do famoso recém solteiro”. E o cenário mudou de
novo, eu não precisava vasculhar muito a minha mente para descobrir que era a
minha rua no Canadá. Parei em frente da casa que era para ser minha, mas de
algum modo eu sabia que não era. No jardim , haviam três crianças brincado,
dois meninos e uma menina, com um Pastor Alemão que os derrubava fácil por
causa do tamanho e peso, mas as crianças não pareciam se importar quando caiam,
eles riam e corriam do cão que também levava tudo na brincadeira. Um dos
meninos tinha o cabelo num castanho quase loiro e umas feições que me fizeram
ter a sensação de que o conhecia.
- Josh! – ouvi alguém
gritar atrás de mim e esse menino olhou na minha direção me dando visão de seus
olhos que só reforçaram a sensação que eu o conhecia. – Vem! Está na hora do
jantar – parei de encarar a criança e olhei para quem o chamara. A casa era a
mesma e a dona também.
Fiquei surpreso ao vê-la, o tempo lhe fizera
bem, Lua continuava linda como sempre. Olhei para a criança de novo, ela se
despediu do menino, que era no máximo dois anos mais velho, e da menina, que
parecia ser da mesma idade, chamou o cão, mas ele continuava correndo para lá e
para cá esperando que a garota jogasse uma bolinha vermelha. Chris abriu a
porta da casa que era para ser minha e chamou aquelas crianças, depois acenou
para a Lua que devolveu o aceno.
- Venha Josh! – Lua
voltou a chamar o menino e ele então correu até ela me dando visão mais uma vez
de seus olhos. Agora sei porque tinha a impressão que o conhecia.
Lua desceu as escadas esperando o menino que
pulou em seus braços assim que ela os abriu. Eles se abraçaram e ela se sentou
com ele no colo, virado para si, ambos sorrindo.
- Mamãe, quando o papai
vai vir me visitar?
- Eu não sei meu anjo.
- Ele não gosta mais da
gente mamãe?
- Também não sei meu
amor. Agora entre e lave as mãos – ela o pôs no chão e deu uns tapinhas
encorajando para que subisse. – Nowhere! – ela assobiou e o cachorro que estava
deitado na grama começou a correr vindo na direção dela. Ela o mandou entrar em
casa e depois de alguns pulos, o cachorro entrou.
Antes de levantar, Lua soltou um suspiro, sua
expressão não era as das mais felizes. Depois ela caminhou lentamente até a
porta e antes de fechar olhou para o anelar da mão esquerda e mexeu como se
tivesse algum anel enquanto o que restava era uma fina marca quase
desaparecendo.
Senti que deveria por as mãos nos bolsos e
assim fiz pegando dois anéis, dentro deles estava escrito: “I Need You Forever”
com uma letra caprichada, mas esse anéis eram dourados.
Eu sabia por que tinha a sensação que conhecia
o menino, ele lembrava de como eu era aos cinco anos de idade que era o que a
criança parecia ter, e os olhos, os olhos dele eram parecidos com os da Lua,
por isso a terrível impressão que o conhecia. De algum modo eu sabia que aquele
menino tinha me chamado de “pai” e que a minha fama tinha me separado da Lua,
eu me frustrei com a vida de casado e fiquei vagabundando por aí com uma garota
a cada vez que saia.
E então acordei não só assustado, mas ofegante
e com um nervosismo que parecia sair da espinha. Como já disse, estava mais
para pesadelo do que um simples sonho.
Me levantei da cama e caminhei até o banheiro
sentindo que as minhas pernas poderiam fraquejar. Deixei a água passar pelos
meus dedos, mas parecia que a última cena ficava mais nítida agora que eu já
tinha acordado, então lavei meu rosto pelo menos umas três vezes e me encarei
no espelho tentando descobrir qual foi a pior parte do sonho: o olhar
decepcionado da Lua para o dedo anelar, a voz triste do meu filho, ou, eu ter
virado um cara frio e sem escrúpulos, um canalha infeliz.
A mais estranha, com certeza, era pensar em
“meu filho” sei lá, parece uma ideia tão distante, é como se a minha vida
tivesse começado ontem.
Resolvi tentar esquecer, pus uma roupa
qualquer e desci para tomar café, a minha mãe me esperava já com uma xícara de
café nas mãos, lendo o jornal. Me sentei ao lado dela.
- Quer ler o jornal? –
ela tomou um gole.
- Tem algo sobre mim?
- Não que eu tenha
visto, ainda.
- Então não, valeu –
peguei qualquer coisa para comer e ficamos em silêncio.
- Agora achei – ela se
levantou e deu a volta no balcão enquanto lia – “O cantor Justin Bieber foi visto em um parque da sua cidade natal no
Canadá conversando com uma garota na tarde de ontem. Infelizmente para as fãs
do garoto, nenhuma foto que pudesse identificar essa garota foi publicada. Eles
correram assim que notaram os fotógrafos começando uma perseguição pelas ruas
da cidade, mas conseguiram despistar os paparazzi”.
- Inferno – foi o que eu
consegui dizer.
Na verdade eu nem prestara muita atenção, o
que a minha mãe disse não foi nada além do que eu já sabia, eu mal notava,
sequer, que estava fazendo redemoinho num copo de suco com a colher de açúcar.
O sonho atormentava a minha mente, eu não conseguia esquecer.
- Preciso ver a Lua –
conclui já me levantando.
- Para que?
- Sei lá, eu só preciso
ir lá.
- Mas são nem 10 horas
da manhã!
- Ainda sim preciso ir.
- Termina pelo menos de
tomar seu café!
- Perdi a fome – fechei
a porta e coloquei meu casaco que peguei no cabide próximo a porta antes de
sair.
Caminhei até a casa da frente com a parte das
alianças martelando na minha cabeça. Quando cheguei ia bater, mas acabei pondo
a mão na maçaneta e a porta se abriu.
- Lua? – fui entrando
devagar.
Vendo ela daquele jeito
de repente me fez lembrar que eu era apenas um cara que ainda usava supra e aba
reta. O sonho parou de pairar pela minha mente.
Já a Lua nem me deu confiança, continuava de
pé na frente da tevê, com uma garrafinha na mão e um canudo engraçado que
ficava preso à tampa da garrafa na boca, vestia apenas uma calça de moleton
cinza e uma blusa regata do mesmo pano e cor, mas a blusa era justa e a calça
não, ou seja, ela estava de pijama assistindo Bob Esponja.
- Você me lembrou a
minha irmã. Ela acorda, pega a garrafinha, agora que não usa mais mamadeira, e
fica na frente da tevê assistindo desenho. Não está muito velha para isso?
- Velha é a senhora sua
mãe. E nunca se é velha o suficiente para assistir Bob esponja – ela se sentou.
– Já que invadiu a minha casa, se senta pelo menos.
- Não me diga que você
acorda cedo para ver desenho? – me sentei do outro lado do sofá.
- Não, eu não acordo
cedo. Meus pais me acordaram com a barulheira antes de sair de casa, acho que
não tem nem uma hora que levantei.
- Nota-se, ainda está de
pijama!
- Mas não pretendo sair
de casa hoje.
- E isso quer dizer
que...
- Que ficarei de pijama
o dia todo! Tem coisa melhor do que isso? – ri da expressão empolgada dela.
- Acho que não – até ela
riu. – Mas ainda acho que você está velha demais para assistir Bob Esponja.
- E você quer que eu
veja o que? Descovery Chanel? – ri.
- Também não exagera.
Mas mesmo assim...
- Ah Justin! Para! Eu
sei que estou crescidinha para isso, mas bob esponja é legal.
- E põe crescidinha
nisso – foi inevitável “analisar”, eu juro.
- Você sempre faz isso
né!? Vem com esse jeito safado e acaba estragando toda a graça da coisa.
- E você sempre faz de
tudo para voltar.
- É inevitável!
- Para mim também.
- Você está pior... –
ela semicerrou os olhos.
- Ah para Lua! Nem vem
dar uma de santa! Você faz pior comigo! Você me provoca ou da confiança para as
minhas “safadezas” – fiz as aspas –, mas depois cai fora.
- Eu? Dou confiança as
suas safadezas? – cinismo óbvio e proposital.
- Claro! Assim você me
confunde.
- Eu sempre te confundi
– ela se inclinou para frente, pondo as mãos no sofá e aproximando de mim.
- Você sempre diz isso.
- E você nunca reclamou
– ela se aproximou mais. O sofá nem era grande assim, então ela ficou em cima
de mim.
- Você também sempre diz
isso.
- E alguma vez você
reclamou?
- Não.
E lá estava ela me provocando mais uma vez,
seus lábios tão perto dos meus... Eu estou me sentindo um idiota mais uma vez.
Mas nem para ela ajudar, eu não sei, poderia me beijar logo ou apenas deixar
que eu a beijasse já que fugia de todas as minhas investidas, só que ao invés
disso, brincava e ria das minhas tentativas frustradas de beijá-la.
Em uma fração de segundos ela investiu para
frente, mas antes mesmo que seus lábios pudessem chegar, completamente, aos
meus, se afastou com tamanha rapidez e ainda por cima bateu com as costas no
braço do sofá.
Era para eu estar zangado, e de certa forma eu
estava, mas ela ria e me olhava de um jeito “menininha sapeca” como
antigamente, vendo aquilo eu não conseguia sequer fazer cara de quem estava
bravo.
- Você já pensou que eu
poderia não deixar você se afastar quando me provoca?
- Já, mas você não vai
fazer isso.
- Por que eu não faria?
- Porque me ama! – ela
fez uma voz de criança, uma “carinha feliz” e depois começou a cantarolar. –
Ah! E você fica todo entorpecido quando te provoco – a “carinha feliz” agora
tinha convencimento também.
Fiquei a encarando por
um curto tempo, com um sorrisinho de canto de boca, enquanto ela ainda estava
com aquele sorriso arteiro e me olhava como se estivesse me desafiando a seguir
em frente.
Resolvi aceitar o desafio.
Inclinei meu corpo para
frente num impulso e nessa mesma hora bateram na porta.
- Está aberta – o
sorriso dela piorou. Ela me olhava como se quisesse dizer: “Se ferrou, eu
sempre vou te provocar e você nunca vai fazer nada”, mas eu me controlava
apenas para não demonstrar nenhuma emoção e deixar a mesma expressão neutra,
apesar de que não era um grande esforço, a confusão dentro de mim era tão
grande que nenhuma era forte o suficiente para transparecer.
- Estou atrapalhando
alguma coisa? – olhei para porta.
- Não Chris – agora ela
olhou –, entra aí – ele obedeceu e fechou a porta parando enfrente da mesma.
- Tem certeza que não
atrapalhei nada?
- Não – Lua respondeu.
- Justin? Você não está
querendo me matar? Me jogar do avião quando eu for viajar com você ou algo do
tipo?
- Não – respondi. Era
para eu estar com raiva do Chris, mas por mais estranho que pareça, não estava.
- Então ta né. – ele deu
de ombros. – Lua, caiu da cama?
- Meus pais me acordaram
sem querer.
- E cadê eles?
- Saíram para sei lá
onde e voltam sei lá que horas – ela se levantou, pegou uma tigela que estava
com uma colher dentro e um resto de leite, a garrafinha com o canudo engraçado
e foi para a cozinha.
- Ué, te acordaram e nem
isso você sabe? – Chris a seguiu e eu levantei apenas quando ele passou por
mim.
- Claro que não, eu sou
a filha, eu que devo dar satisfações a eles e não eles a mim. Estou crescidinha
para isso e outra, eu tinha esperanças de ainda dormir. – ela jogou a tigela na
pia e virou para o balcão da cozinha reformada, que foi onde Chris e eu
sentamos. – Bom, – ela olhou no celular que estava encima desse mesmo balcão –
são nem 11h da manhã, que eu saiba você acorda só depois do meio dia, o que
houve? – perguntou para o Chris.
- Perdi o sono, não sei.
- Então resolveu vir
para cá por que?... Você sabe que se eu estivesse dormindo quando a mensagem
chegou eu iria te esgoelar até a morte né?
- Espera aí! – Interrompi.
– Você sabia que ele viria?
- Sim – ela mexeu no
celular e depois me entregou.
- Estava entediado em
casa, nunca tem nada para fazer nas férias, apesar de que eu não quero voltar
para a escola – ele respondeu enquanto eu lia a mensagem que ele mandou às 9:17
a.m: “Ta acordada? Diz que ta! Não
aguento mais ficar em casa”, ela respondeu: “Infelizmente estou. Que foi?”, e nem dois minutos depois: “Vou para aí! Não tem nada para fazer aqui”,
a resposta foi logo em seguida: “Nem
aqui”.
- “Mas é melhor fazer nada juntos do que sozinhos” – li em voz alta e
depois olhei para o Chris.
- Que foi? – continuei o
olhando e a Lua caiu na gargalhada.
- Me poupe Justin – ela
respondeu.
- Eu leio “Mas é melhor fazer nada juntos do que sozinhos”
e vocês querem que eu pense o que?
- Nada – ela continuou –,
não tem nada o que pensar.
- Não sei não...
- Eu de repente senti a
necessidade de mudar de assunto – Chris disse. – Não que eu esteja a fim de
voltar para a escola, mas ficar em casa está muito chato! Vamos, sei lá, para o
cinema amanhã?
- Amanhã eu não posso,
marquei de ir ao shopping com a Hayley.
- Para uma garota que
odeia futilidades, você gosta demais de shopping – disse e ela deu ombros.
- Então pode ser no
domingo.
- Não rola, estarei em
Londres.
- Que droga em! Parece
que todo mundo arruma algo para fazer, menos eu! – ele reclamou. – Agora eu vou
ter que ficar em casa nessa vida monótona.
- Deixa de ser exagerado
Christian! Você só deu azar, sempre to em casa.
- Não posso dizer o
mesmo, to mais viajando do que em casa.
- Já sei! – ele se
animou de repente. – Já que nossos horários nunca batem, a gente poderia marcar
uma noite de filme.
- Noite de filme? – ela
perguntou.
- Sim, claro, se o
Justin concordar.
- Tenho que concordar em
que?
- A gente podia arrumar
um filme para assistir sempre que Justin voltar de viagem, claro, desde que não
seja de madrugada como acontece uma vez quase sempre.
- Desculpa, minha mãe me
obriga a ir para escola ok?
- Também, ano passado você
não estudava, não sei por que resolveu voltar esse ano – Lua disse.
- Tem certeza que não
sabe? – a encarei nos olhos.
- Esquece! Continua
Chris.
- Mas eu já disse o que
tinha para dizer.
- Então a sua ideia é
uma noite de filme na casa do Justin quando for possível depois que ele voltar
de viagem, isso?
- Foi isso que eu disse.
- Por mim tudo bem –
disse.
- Então ta, eu topo – Lua
completou.
- Falando em Londres,
Justin... – Chris começou. – Quando você vai me levar numa viagem de novo?
- Como assim te levar?
Eu quero ir também oras! Dependendo do destino claro!
- Vou para Los Angeles
antes das aulas recomeçarem, posso levar vocês.
- Sério? – Lua pareceu
não acreditar.
- Por que eu mentiria?
- LA? Califórnia?
- Tem em outro lugar?
- Sei lá, custa nada perguntar
Sr. Arrogante – ela deu de ombros.
- Putz, não dá para ter
duvidas que vocês se amam.
- Chris, faz o favor de
calar essa boca!
- Ta, ta. Desculpa
revoltadinha.
- Cala a boca tigrinho.
- Ti... – interrompi o
Chris.
- Ou! Para vocês dois!
Nota-se que também se amam!
- Enquanto vocês ficam
resolvendo o que parece que amam quem, vou lá em cima – ela bagunçou ainda mais
o cabelo, deu a volta e subiu as escadas.
- Agora fala, eu
atrapalhei alguma coisa quando cheguei não foi?
- Foi, mas – me
levantei, dei a volta no balcão, peguei um copo, fui até a geladeira e enchi
com água depois voltei para o outro lado do balcão que eu estava –, por
incrível que pareça, não estou me importando com isso.
- Sério? – ele pareceu
realmente surpreso.
- Uhum – bebi a água num
gole só. – Estou pensando em outra coisa, o fato de você ter chegado, não muda
em nada a minha conclusão.
- Posso saber que
conclusão é essa? – na mesma hora meu celular tocou, quando fui ver era uma
mensagem.
- Não, agora pelo menos
não – saí da cozinha correndo e subi as escadas na maior velocidade que
conseguia.
Chegando lá em cima,
respirei fundo fingindo não ter tanta pressa antes de aparecer na porta do
quarto.
- Não adianta Bieber! Eu
ouvi você subir correndo. Da próxima tenta bater menos o pé quando correr –
agora sim apareci.
- Pareci um pouco
desesperado?
- Não...
- Ainda bem.
-... Só muito.
- Ah! – ela riu. – Mas o
que você queria?
- Leva isso lá embaixo
para mim? É pesado e eu não estou sequer a fim de tentar levar essa caixa.
- Só isso?
- Só.
- Ah ótimo! – acabei
dizendo num to zangado.
- Deixa de ser
revoltado! Leva para mim?
- Fazer o que!? – dei de
ombros.
- Diz “não” se não
quiser oras! Se não quiser, não precisa.
- Não, não, eu levo. –
fui até a mesa do computador e peguei uma caixinha pequena, mas era bem pesada.
– O que tem aqui? Chumbo?
- São umas coisas para o
meu pai – ela deu de ombros. – Agora vamos descer, meu quarto está uma bagunça.
- E quando não está? –
ela pareceu pensar.
- É, você tem razão.
Agora vamos, anda! Anda! – ela me apressou para descer.
Descemos devagar sem falar nada, mas nos últimos
degraus ela me segurou pelo ombro incentivando para que eu virasse, e quando
virei, ela me beijou, me controlei ao máximo para não deixar aquele peso na
minha mão cair e envolver ela em meus braços. Descobri que sinto falta disso.
- Estava te devendo essa
– ela praticamente sussurrou, depois sorriu e desceu as escadas correndo –
Voltei!
(...)
- Justin!
- Que?
- Desce!
- Para que?
- Você lembra que amanhã
vai viajar por acaso?
- Ta, ta já estou indo.
– Saí do quarto cheio da má vontade e quando cheguei ao andar de baixo ainda
não tinha nenhuma. – Vamos andar logo com isso – me joguei no sofá.
- Por quê? O que está
fazendo de tão ocupado?
- Nada.
- Então porque está tão
apressadinho?
- Porque ultimamente
estou sentindo falta de fazer “nada” – a minha mãe não falou mais, apenas
sentou esperando Scott voltar da cozinha.
Quando ele voltou começou toda aquilo de
“repassar a agenda” e de como seria viagem, os shows, o hotel e bla, bla, bla,
bla. No começo isso tudo era bem legal, planejar as minhas viagens e até mesmo
saber que precisaria de uma segurança reforçada por causa das fãs, mas agora,
não vou dizer que perdeu a graça, mas, não sei explicar bem, o que posso
garantir é que não quero mais fazer isso, não para sempre, por um tempo.
Férias! Acho que isso iria ser bem legal, um pouco de férias.
- Tenho direito a um
break? – pedi.
- Mas... – interrompi.
- Uma água, um descanso,
um tempo, por favor, Scooter! – tenho a impressão que saiu um pouco desesperado
demais.
- Tudo bem, preciso
levantar um pouco daqui – minha mãe disse e se levantou indo para cozinha. Fui
atrás dela, mas tocaram a campainha antes que eu pudesse chegar lá. – Abre a
porta filho – fui até lá e abri.
- Achei que não sairia
de casa.
- Não iria até meu pai
vir com uma conversa louca – ela foi entrando, sem ao menos que eu convidasse,
também, não era necessário.
- Que conversa louca?
Posso saber? – a porta ficou aberta e nós dois à cerca de dois passos dela.
- Ele quer tirar meu
carro.
- Por quê?
- Por causa da minha
última “fuga”. – Ela fez as aspas. – Ele disse que eu corro demais e que vai
tirar meu carro para ver se eu aprendo, para escola já vou ter que ir a pé! Vê
se pode!
- Pode.
- O que?
- Sim, ele pode,
primeiro que ele é seu pai segundo que você realmente corre demais.
- Ah ta! Desculpa Sr.
tartaruga.
- Não sou tartaruga, só
não vou correr a 200km/h num lugar de 80km/h.
- Não corro a 200 em
lugar de 80.
- E você acha que a
velocidade permitida nas rodovias que divide a cidade é quanto?
- Quer saber, esquece! –
ela começou a procurar alguma coisa no bolso da frente da calça que usava, e
depois puxou um pequeno chaveiro verde de monstrinho com algumas chaves, uma
das, do carro.
Puxei da mão dela.
- Hey! Me devolve!
- Você não vai dirigir.
- Você não é meu pai!
- Mas ele não deixou
você dirigir também.
- Justin, me dá essas
chaves!
- Não.
- Agora.
- Não. – ela grunhiu de
raiva.
- Quer saber, vai para o
inferno – e saiu com raiva fechando a porta que bateu com força.
- Justin? – a minha mãe
apareceu na sala. A olhei – Desculpa, mas temos que voltar para a sua viagem,
faltam algumas coisas ainda para organizar – respirei fundo e caminhei
apressado até a porta.
- Lua! – ela se virou e
ficou apoiada em uma perna só. – Vamos dar uma volta – ela abriu um sorriso e
eu continuei a caminhar até o carro, jogando as chaves para ela.
Entramos, ela ligou e nós partimos.
No começo éramos apenas dois adolescentes
andando de Porshe, a menos de 60km/h, com o capo levantado e as janelas
completamente fechadas com o insulfilm mais escuro possível, não identificando
quem estava dentro do carro. Depois, éramos dois adolescentes com o capo aberto
a toda velocidade, rumo a lugar nenhum numa estrada quase deserta. Perigoso,
ok, mas eu estava começando a achar que a Lua não está tão louca assim, a
adrenalina que corre pelas veias relaxa de um modo inexplicável.
Em certo ponto, a guiei aos berros. Mandei que
entrasse em uma pequena abertura no lado direito da estrada, o terreno era de
terra e havia pedrinhas, envolta de nós, apenas árvores altas até uma saída
ampla, com grama rala e uma vista exuberante. O Final de um penhasco.
- Uau – ela disse ao
sair do carro.
- Legal né? Dá para ver
a cidade toda daqui.
- Dá mesmo! Olha a
escola! E o parque! Aquela ali parece a pontinha da minha casa – ela foi
apontando toda animada, como uma criancinha. – Como você achou isso? É tão
escondido e feio o caminho, eu nunca iria imaginar que no final poderia ter um
lugar tão legal como esse – me olhou.
- Eu entrei aqui sem
querer, foi o maior susto da minha vida, quase caí penhasco a baixo. – Ela
arregalou os olhos e depois riu. – Vim aqui apenas três ou quatro vezes, talvez
cinco, sempre perdi a noção de hora e minha mãe ficava louca, bom, não só ela,
não estou em situação de sumir há um bom tempo, mas, é engraçado porque, era só
ela olhar para o alto que eu estaria lá.
- Tecnicamente dizendo –
soltei uma risadinha e permaneci com um sorriso de lado.
- É, tecnicamente
dizendo.
- Você realmente gosta
de vir aqui né?
- Aqui se tornou o meu
lugar especial.
- Só uma perguntinha: E
a casa da árvore?
- Lá ficou perigoso
demais. Sempre iam me procurar no parque, e eu não queria que a descobrissem
lá, então mudei de lugar, mas aqui é mais longe então...
- Entendi.
- Também não tenho todo
o tempo do mundo não é mesmo?
- Não sei? É? – ela
sorriu e eu ri.
- É.
- Você está triste. Não
gosto de te ver triste, me entristece também.
- Mentirosa.
- Ou! Tudo menos
mentirosa! Sorri logo, anda! Estou mandando! – sorri forçado. – Forçado não! De
verdade, qual é! Não vejo motivo para você está assim.
- Coisas...
- Estamos longe de tudo!
De que essas coisas importam? Anda Jus, sorria – a olhei com as sobrancelhas
erguidas, “Jus”? Notando o que tinha falado, ela arregalou os olhos e ficou sem
graça. Acabei rindo, realmente rindo.
A questão era: ela não me chama assim há
realmente muito tempo, é sempre Justin, Bieber, estrelinha, astrozinho,
famosinho, ou qualquer outro jeito menos “Jus”, que era como ela me chamava
quando nos conhecemos, quando namoramos sendo mais exato.
- Pelo menos você riu.
Mas esquece isso, se não vou embora e te deixo aqui.
- Ok, ok, Parei.
- Tem uma toalha de mesa
no banco de trás, pega aí – virei e abri a porta do carro puxando um pedaço
grande de pano dobrado.
- Por que tem uma toalha
de mesa no seu banco de trás?
- Esses dias, minha mãe e
eu saímos, ela resolveu comprar algumas coisas, inclusive essa toalha que ela
esqueceu aí, mas, nem sei para que já que nem mesa de jantar temos mais. – ela
deu de ombros. – Dá aqui, quero sentar – ela estendeu a mão e eu a entreguei,
depois ajudei a estender no chão, onde nos jogamos sentados.
- Só faltou algo para
comer – ri.
- Realmente, dá próxima
vez, vou trazer alguns salgados cheios de gordura trans e refrigerantes, com
corante que fazem um mal desgraçado, mas todo mundo come e adora, sendo que eu
não sou uma exceção – ri, de novo. – Bem melhor assim! Não acha?
- Acho, acho! – nos
entreolhávamos. – Sabe, você não mudou. Nada.
- Eu já disse para não
achar isso – o sorriso dela foi desaparecendo e meu foi sumindo aos poucos
junto.
- Estou mentindo?
- Está.
- Pois eu não acho.
- Você mudou, por que eu
não mudaria?
- Não parece! Você acha
mesmo que eu mudei? Me diga em que?
- Não, me diga primeiro
por que acha que eu não mudei.
- Perguntei primeiro.
- Passo a vez.
- Então ta. Seu sorriso
é exatamente como eu lembrava, suas brincadeiras agitadas, seu jeito agressivo
de sempre brincar batendo e viver ameaçando quem gosta de morte continua o mesmo,
eu seria capaz de te identificar em meio a uma enorme multidão só pelos seus
olhos, como já aconteceu se você não se lembra – ela abaixou a cabeça –, seu
olhar menininha inocente, garota sapeca e de quando quer me provocar – pus uma
das minhas mãos em seu queixo e fiz com que levantasse o rosto – parecem o
mesmo olhar de um ano e pouco atrás. Apesar dessa nova loucura de correr, você
parece a mesma menina extremamente feliz e sorridente que eu ajudei a
ressuscitar quando tinha 16 anos, quando tínhamos 16 anos. Eu não acho que você
tenha mudado – aproveitei a minha mão ainda em seu queixo e tentei aproximar
mais seu rosto do meu.
Ela desviou o rosto, abaixando a cabeça
novamente visivelmente envergonhada e mais alguma coisa que não consegui identificar
bem.
- Ou talvez tenha mudado
sim – voltei a erguer sua cabeça –, a garota que eu conheci nunca ia ficar tão
quieta e envergonhada assim – a encarei nos olhos, e acho que agora, ela não
iria “fugir”.
- Talvez não, eu
realmente mudei – ela segurou a minha mão a abaixou ainda olhando nos meus
olhos – e eu não quero que você tenha a mesma imagem de mim Justin, vai acabar
se decepcionando se me comparar a antes, eu cresci, você cresceu, não somos
mais crianças. Eu vivi muita coisa, muitas experiência, meus medos agora
mudaram e talvez sejam eles que ainda não deixaram que nós já estejamos juntos.
Talvez não, são. Assumo que tenho medo, não quero me precipitar, não quero
sofrer de novo do mesmo jeito, não tenho nem certeza do que eu sinto por você,
se ainda sinto algo por você, mas pode ter certeza que há algo, por mais que
seja um resto de sentimento, é o que me incentiva a te provocar e ainda contar
com você. É esse restinho que me faz estar aqui agora por exemplo.
- Você esclareceu bem as
coisas, mas eu não entendi muito bem onde isso de “eu mudei” entra.
- Você vai descobri,
basta abri os olhos para o que sou hoje, não para o que eu era.
- Não aguento esperar.
- Tenha paciência
garoto, você acha que eu não estou com vontade de berrar na sua cara e dizer
tudo de uma vez? Mas não faço porque sei que não vai dar certo, além de que vou
te magoar por você me ver como antes, não como agora.
- Que foi? Vai me dizer
agora que virou uma garotinha fashionista de Manhattan?
- Ou! Não exagera! Não é
só porque eu mudei meu comportamento que eu mudei a minha personalidade, não
confunda as coisas.
- Eu nem sei mais o que
é confuso ou o que é claro, as certezas deram lugar para as incertezas e a cada
nó que desata em minha mente, atam dois ou três.
- Mas daí a me chamar de
fashionista é viagem demais.
- Ta, ta. Desculpa. –
ela não respondeu. – Mas então, vamos ficar aqui, olhando para a cidade lá
embaixo, sem falar nada? – ela deu de ombros.
- Você sabe que eu não
consigo ficar quieta.
- E se sei. – rimos. – Sei
que você não quer se precipitar e a situação lá em baixo, não está das melhores
para ficarmos juntos, mas, como foi mesmo que você disse? “Estamos longe de
tudo! De que essas coisas importam?”.
- Aonde você quer
chegar?
- Fica comigo? – ela me
olhou indecisa. – Me olhando assim até parece que estamos fazendo a coisa mais
errada do mundo! Você também quer, ou vai mentir depois disso tudo? – ela ficou
me encarando por um tempo e depois respirou fundo.
- Você venceu. Por hoje.
- Isso quer dizer
que?...
- Que amanhã é outro
dia. Não espere que tudo o que acontecer aqui mude alguma coisa amanhã, melhor
não criar falsas esperanças.
- Só por você estar
comigo, agora, para mim é o suficiente.
Investi correndo o risco de que ela desviasse,
mas depois disso, era algo que eu duvidava, e como eu esperava, ela deixou.
Isso chegava a ser engraçado porque, parecia que tudo estava “normal” quando
não estava, e nos – pelo menos eu – sentíamos certos quando na verdade
estávamos completamente errados, apesar de que havia algo dentro de nós que
sabia e tentava nos informar que era apenas temporário, a nossa maior parte –
pelo menos de mim – acreditava que iria ser para sempre.